sábado, 27 de fevereiro de 2021

Enterro - 2, do poeta Octávio Mora

Enterro - 2

Minúsculo assim dentro de um caixão,
eis um homem enfim com sua vida
de início ao fim, a tábuas reduzida -
quatro tábuas e mais uma, a do chão,
aquela que lhe dita a posição
que terá para sempre, a mais comprida,
igual em comprimento e tão despida
quanto a que o cobrirá de solidão.
Se a de baixo é menor sendo assoalho,
parece entre as dos lados apertado
mas é com a de cima que amortalho
o seu sono de gelo evaporado.
E o seu corpo que sempre foi cascalho
finalmente está líquido, parado.

Antônio Mora (1933-2012) nascido na Argentina e radicado no Brasil

Obra de arte de Roberto Burle Marx.

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2021

Não procures Deus fora de ti, de Antônio Ramos Rosa


Não procures Deus fora de ti
no seu espaço infinito.

Não tentes ascender ao céu
no esforço de saíres de ti
na tua condição.

Não queiras ser mais do que o abandono de um abandonado.

Não cedas à tua vontade de querer
de poder de ser ou de não ser
não aceites nada que não seja o nada.
Deixa-te cair
até ao fundo
como se no íntimo de ti
como se
no silêncio do silêncio
sem nome
o que tu nunca saberás
respirasse
o futuro amor sempre inconcluído.

Do poeta português Antônio Ramos Rosa.

Obra de arte intitulada "Paraíso Perdido" de Gledson Franqueira Amorelli.